
Salvador Dalí, La memoria de la mujer-ninã (1929) – Museo Reina Sofia
Kátia Ribeiro Nadeau (CLIPP)
As teorias sexuais infantis partem de uma primeira investigação das crianças a respeito dos três grandes enigmas do ser falante: sexualidade, procriação e morte. Enigmas estes que, por não se localizarem no campo do registro simbólico, deixam a questão da verdade em aberto.
Entre o consciente e o inconsciente localiza-se o conflito psíquico, entre a” explicação” dos adultos e as próprias (reprimidas e inconscientes) surge o núcleo das neuroses. Entre a experiência vivida e observada da vida sexual, até a desconfiança de que os bebês crescem no interior do corpo da mãe, surge a formulação da pergunta “como esse bebê chegou lá”? A teoria da cegonha como resposta, como falsa teoria, vai se contrapor à própria sexualidade vivida em seu corpo.
Segundo Freud, embora as falsas teorias sexuais infantis cometam equívocos grotescos, cada uma delas contém um “fragmento” de verdade, como veremos a seguir.
Teoria 1: TODOS TÊM PÊNIS
Na infância a zona erógena por excelência é o pênis, advinda do desconhecimento das diferenças entre os sexos. É auto erógena a partir da complicação da excitação autônoma e inexplicável do órgão, associada à misteriosos acontecimentos e atividades mentais da criança, tais como compulsões obscuras, atos violentos e o malogro da conclusão intelectual sobre a penetração.
Teoria 2: TEORIA CLOACAL
A ignorância da existência da vagina leva à seguinte conclusão: “o bebê precisa ser expelido como um excremento”, e a posteriori, “o bebê sai pelo umbigo”.
Deste ponto decorre o erotismo anal, onde homens e mulheres podem ter filhos e dar à luz.
Teoria 3: TEORIA DA CONCEPÇÃO SÁDICA DO COITO
Formulação segundo Freud, na qual o impulso violento do mais forte em relação ao mais fraco, leva as crianças à tal interpretação, juntando ato de amor a ato violento – um claro desvio sobre uma conclusão mais assertiva sobre “de onde vêm os bebês”.
Do mesmo modo, as manchas de sangue na cama da mãe levam ao “engano infantil” interpretando falsamente como agressão paterna, além do “horror ao sangue”, que contém novamente um fragmento de verdade “vestígios de sangue como uma interpretação da iniciação sexual”.
Além disso, revelações incompletas sobre a existência da vagina e sua finalidade; o total desconhecimento do sêmen como outra substância diferente da urina.
Freud destaca a partir destes pontos, a respeito da psicanálise dos neuróticos adultos, que estes são “aparentemente ignorantes”, o que evidencia um forçamento do conteúdo recalcado.
Freud, nos desenvolvimentos em textos posteriores aos “Três ensaios sobre a sexualidade” vai demonstrar a realização imaginária da diferença entre os sexos, apontando também para a diferença entre o registro sexual e o genital .
Alguns pontos chaves em destaque:
- Sintoma Neurótico – atividade sexual infantil
- Sexualidade infantil diferente da cronológica
- Psicanálise trabalha com o tempo lógico
- A sexualidade infantil é perversa polimorfa e auto erótica
- Se a sexualidade infantil é auto erótica, elimina o Outro assim como o ocorre no sintoma neurótico.
Uma análise toma o caminho para sair da relação auto-erótica e incluir o Outro, ressaltando que a relação objetal não é uma relação pré-estabelecida, já que o objeto de satisfação é vazio.
O desejo de saber passa pela entrada no campo do Outro e pelo sexual que a mobiliza.
- Todos têm pênis
- Alguns perdem, outros não
- Se alguns perdem (mulheres), os homens também podem perder
A mulheres perderam e se perguntam: “posso voltar a ter?” (-)
Os homens se perguntam: “O que tenho que fazer para não perder?” (+)
Tomando assim o Falo como referência simbólica positivada, onde o negativo é uma ausência.
O tratamento psicanalítico mira aquilo que fracassa na via do sentido, e a neurose surge como resposta ao fracasso do Édipo. Freud percorre o caminho da prevalência do Falo, enquanto Lacan privilegia o significante no campo simbólico, em seu primeiro ensino .
Tomar as teorias sexuais infantis como ponto de partida ou seja, tudo que o falasser inventa para lidar com sua existência, oferece uma direção, um caminho – nas análises, ao fazer falar as lembranças encobridoras, as mentiras e equívocos da língua, sonhos, delírios, fobias, traumas …
Na neurose trata-se de fazer falar o objeto da satisfação. Na língua falada por cada um, um núcleo de gozo singular comanda os sintomas e os modos de fazer laço próprio a cada um.
Falar da criança e com a criança, equivale a falar com o trauma, a falar com o UM do gozo que não faz par, da erótica das coisas ínfimas e também com essa alegria descrita por Lacan, que se encontra naquilo que constitui o trabalho com a psicanálise.