Resumo da ópera
Noemi de Araújo
No mês de abril, o Seminário de Formação Permanente da CLIPP-SP, “Psicanálise eArte: música”, teve como convidado o psiquiatra, psicanalista e pesquisador de Ópera Andres Santos Jr.
Totalmente despido do seu jaleco branco, do Hospital do Servidor de São Paulo, Andres nos apresentou sua pesquisa sobre psicopatologia e ópera. Escolheu, por meio da exibição de trechos de óperas do período romântico, explorar o tema naquilo que ele tem de universal e de particular, comentando conteúdo, personagens, trabalho dos atores, voz, olhar, gestualidade, maquiagem, figurino, cenário, uso do espaço e do tempo, reação ou recepção do público nas apresentações como algo que interfere no espetáculo. Identificou as psicopatologias (de acordo com a época) presentes em cada ópera comentada.
A questão da transmissão [O que é “ensinar” a psicanálise (modelo universitário) e o que é“transmitir”?]
Muito embora houvesse, da parte de Andres, preocupação em estabelecer uma correspondência entre algum personagem da ópera com algum traço da nossa cultura psicopatológica (a figura do alcoólatra, do depressivo, entre outras), foi sua transmissão que contagiou e provocou nosso público, até mesmo os que não eram psicanalistas (quem não saiu de lá com vontade de ver uma ópera?). Creio que tal provocação de Andres não difere daquelas dos nossos analistas ou supervisores quando nos instigam a querer saber mais…
O próprio Andres nos permite fazer essa relação dialética entre “ensinar” e “transmitir”, porque é possível incluir aí nossa experiência de trabalho com ele, de quase dez anos no hospital, com as apresentações de pacientes, em que ele encarna o personagem do mestre (médico psiquiatra). Como tal, ensina-nos as coisas da ciência. No seminário, ele nos transmitiu o sentido da ópera em vez de falar sobre… Completamente tomado por essa “transmissão”, poderíamos dizer que ele se colocou na posição de “analisante”.
Debate
A arte e o debate atual: psicanálise e cultura
“L’art est un moyen de s’auto-intoxiquer (comme l’opium)”Marcel Duchamp
Primeiramente se discutiu a relação que o homem estabelece com a obra de arte na sociedade de consumo. A partir da lembrança de uma frase de Glauber Rocha, “brasileiro não vê filmes, lê legendas”, questionou-se o fato de que hoje os freqüentadores de cinemas, ou museus, passam muito tempo lendo legendas; isso não deixa de ser um modo de não entrar em contato com a obra. Para Andres, aprecia-se tudo que está em torno da obra de arte, numa ópera, por exemplo, o silêncio é fundamental. Mas, é importante que se leia alguma coisa antes do espetáculo, ou de uma exposição, recomenda Andres.
Para Sandra Grostein, na AMP (Associação Mundial de Psicanálise) a arte faz parte do debate atual. Ora, “na sociedade contemporânea, quais seriam os outros recursos que a cultura oferece para que o sujeito possa gozar sem precisar recorrer à droga ilícita ou à farmacológica, à violência, por exemplo? Em que medida a arte (ópera, música, cinema, teatro, literatura, artes plásticas) pode entrar como uma outra opção na nossa cultura?”
Andres responde com um silêncio. Por fim, Maria do Carmo Dias Batista acrescentou que também faz parte da discussão da AMP a preocupação com os rumos da humanidade:
“Essa cultura está produzindo que tipo de Homem? Qual será o Homem que queremos para o futuro ? Ora, é preciso pensar no futuro da humanidade – que psicanálise queremos para que tipo de homem?”
Observação
– O que diz que um objeto, ou um espetáculo, é uma obra de arte?
– Em arte contemporânea isso se dá por meio de um processo de legitimação que é proposto por um duplo esquema. Por um lado, a crítica propõe os critérios de legitimação e, por outro, o circuito artístico e os seus agentes. Enfim, na arte moderna entra em jogo o trabalho de decantação e amadurecimento dos debates estéticos, em torno das obras, por críticos e historiadores (Rubens Machado).
(São Paulo, abril de 2007).