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Ressonâncias da Atividade de abertura – 1°/2015

             

Sexta-feira chuvosa, lua cheia escondida, temperatura suave, sala cheia de olhares curiosos. Cenário da noite de abertura das atividades da CLIPP, em 2015. Cristina Drummond, analista membro da EBP, de Belo Horizonte, nossa convidada.
O pequeno Hans, caso orientador do Curso de Psicanálise da CLIPP, nesse primeiro semestre, foi o norteador para que Cristina escolhesse a Jovem homossexual, Lorriane, caso apresentado nas Jornadas da NEL (Nueva Escuela Lacaniana) e Alice, de sua própria clínica, para, seguindo essa ordem, ilustrar o encontro de cada um desses sujeitos com um real que os desorganiza, exigindo uma nova resposta singular.

Semelhanças existem. Todos eles enfatizam a relação do sujeito com o enigma do desejo da mãe, sua importância na clínica, além da operacionalidade da função paterna, uma vez que se testemunha seu declínio, na atualidade. Ressaltam, também, um momento de encontro com o real e as consequências possíveis. Temos, então, o pequeno Hans e Alice dominados pelo “engodo da dialética intersubjetiva” (Sem. 4), a criança não completa a mãe como falo imaginário, nem a mãe preenche sua falta com a criança. Ambos vivenciaram a chegada de um irmão, que os deslocou da posição imaginária que ocupavam anteriormente. Para a jovem homossexual, também, uma criança e a mãe como mulher, grávida. Lorriane, e os momentos marcantes do vazio da separação, aos dois anos, do vazio do apartamento, da cena aos seis anos – pai beijando uma mulher -, que ela não quer ver. A matriz de seu fantasma está definida.
Diferenças existem. Todos formam sintomas em defesa ao real, ao que não é encoberto pelo simbólico, pelas palavras. Como? Aqui, sim, estabelecem-se as singularidades subjetivas.  As soluções são múltiplas e desorganizadas. Vejamos.

O pequeno Hans pôde organizar e elaborar suas fantasias via significantes abstraídos dos relatos do pai por Freud.  A percepção da agitação de seu “faz pipi”, o medo de perdê-lo, o nascimento da irmã, a presença do pai pouco operativo, o levaram a desenvolver fobia para lidar com a angústia decorrente de seus encontros com o real.

A jovem homossexual assume posição masculina e quer dar à dama o objeto que não tem, o pênis. Busca nela o que lhe falta, o objeto da economia libidinal. Quer mostrar ao pai que só uma mulher pode oferecer o verdadeiro amor.  Sua passagem ao ato, tentativa de suicídio em retaliação ao olhar de desaprovação do pai, é autocastigo à realização do desejo homossexual.

Quanto à Lorriane, nascida de uma gravidez involuntária, recebe da mãe o imperativo “nunca fique grávida”! Desenvolve anorexia como tentativa de se colocar no lugar do falo, um sintoma do corpo da mãe. Responde à gravidez e plenitude da mãe, emagrecendo, emudecendo – uma resposta à feminilidade que recusa. Ser mulher é ser mãe, pensa, logo não é mãe, nem mulher e sangra pelo nariz. Sua análise permitiu a construção de um fantasma e que lhe permite ir além do romance familiar.

É chegada a vez de Alice. Seu encontro com o real do nascimento do irmão, aos 12 anos, a desloca da posição subjetiva imaginária de filha, gerando desorganização e virada de sexuação: de filha exemplar passa a não tomar banho a não estudar, convoca a polícia contra os pais, apaixona-se por adolescente, sentindo um amor que os pais desconhecem. Alice submerge na colagem à mãe. Porém, uma gravidez surge de um estupro: possibilidade de um novo amor, uma nova ordem, um novo mundo vinculado à gravidez e ao site, criado por ela, em busca de um saber não verticalizado? O tempo dirá como sua suposta psicose ordinária a sustentará.

Cristina marca ainda que a clínica é a da criança: a neurose é, desde sempre, infantil. Ela selecionou casos paradigmáticos com muito a ensinar. Dois casos freudianos do início do século XX. Dois casos conduzidos pela orientação lacaniana no início do século XXI. Mostram-nos que no tempo atual a lógica fálica já não é mais a mesma, a relação parental, tampouco. O arranjo edípico é insuficiente para dar conta do sujeito. Tempo marcado pela desorganização tanto do real quanto do simbólico. Embora estejamos em plena clínica do real, três dos casos foram tratados pela perspectiva edípica.

Cristina nos prestigiou com casos condizentes com a questão balizadora de estudo na CLIPP para o ano de 2015: que clínica estamos fazendo hoje?

Cláudia Aldigueri Rodriguez
08/03/15