Editorial #0
EDITORIAL #0 | 01 de Junho de 2020 – www.clipp.org.br
Maria Bernadette Soares de Sant’Ana Pitteri
Hades, o mais temido dos antigos deuses gregos por reinar sobre os mortos, é também deus das riquezas, possuidor que é dos metais preciosos do planeta, pois mora no interior da Terra e não no Monte Olimpo. Tornou-se o governante do mundo inferior ao lado dos irmãos, Poseidon, deus dos mares e rios, e Zeus, deus dos céus e do mundo superior, responsável por destronar o pai, Cronos. Hades apaixona-se por Perséfone e a leva para seu mundo, mas esta é uma outra história. A referência de Virgílio trazida por Freud, no início da Interpretação dos Sonhos, se anunciava como uma abertura infernal, diz Lacan no Seminário 11, o que remete à psicanálise e à descoberta do inconsciente.
Hades #0 nasce para dar voz ao que de precioso é produzido na CLIPP e na Escola de Lacan. Neste número, Leny Mrech demonstra sua preocupação com o ensino da psicanálise, Carmen Cervelatti, ainda na temática do ensino, propõe um trabalho que privilegia a transmissão matêmica de Lacan. Seguindo a ideia de divulgar o que vem acontecendo na Escola de Lacan pelo mundo, convidamos Anaële Lebovitz-Quenehen, psicanalista da ECF, a responder três questões sobre a verdade mentirosa. Maria Helena Barbosa apresenta “Atualidades Psicanalíticas”, trazendo Thomas Svolos que disserta sobre o “Coronavírus e o Furo no Grande Outro”, traduzido por Wilson Braga Jr.
Que Hades nos seja propício!
ENTREVISTA
Entrevista: Anaële Lebovits-Quenehen – Verdade e pós verdade
CLIPP
1. Sabendo que a verdade mente porque ela pertence ao registro do simbólico e seu caráter mentiroso é o preço que ela paga por não pertencer ao registro do real, há alguma maneira de a verdade não mentir?
Resposta: esta pergunta me agrada, pois eu posso respondê-la por um radical: Não. Não há nenhuma maneira de a verdade não mentir pelo menos que seja do meu conhecimento. Mas a verdade mentirosa é suscetível de mentir de modo mais ou menos justo, de forma melhor ou pior, mais ou menos verdadeiramente (…)
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ENSINO
ENSINO DA PSICANÁLISE – Um estudo de Texto
Leny Magalhães Mrech
Eric Laurent em Como se ensina a Clínica? aborda questões relativas ao ensinar e parte de que o psicanalista não tem como vocação o ensinar, sua formação não está centrada no ensino, mas em praticar a psicanálise. Com isso, ele faz um contraponto com a Universidade, constituída para dar lugar ao ensino e que, no entanto, apresentou um fracasso identificado no período de 1966 e 1969. Laurent destaca que nenhuma outra orientação, dentro da psicanálise, colocou tanto destaque no ensino como a orientação lacaniana.
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PESQUISA
Ressonâncias do ensino de Lacan – LACAN, qqueisso?
Carmen Silvia Cervelatti
Um dia, em meio a colegas da CLIPP, surgiu o desejo de promover uma atividade de ensino que se dedicasse aos aforismos, esquemas, grafos, sonhos e casos clínicos trabalhados por Lacan no decorrer de seu ensino.
Principalmente evoco aqui os matemas – capazes de transmitir a psicanálise integralmente, como quis Lacan ao localizar neles a vocação da psicanálise –, uma transmissão mediante a escrita, que convoca, induz produção: na psicanálise sempre é necessário colocar algo de si.
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ATUALIDADES PSCANALÍTICAS
Maria Helena Barbosa
“Atualidades psicanalíticas” traz contribuições de colegas do Campo Freudiano que refletem questões candentes da contemporaneidade. São contribuições que buscam “alcançar, em seu horizonte, a subjetividade de sua época” (Lacan).
Atualmente, diante do real da pandemia, muito material tem sido produzido, mundialmente. Traremos textos, a partir deste número, sobre os efeitos deste real na subjetividade e nos rumos da psicanálise no mundo. Neste número Thomas Svolos pondera sobre os efeitos, na subjetividade, do impacto inicial frente a pandemia, de um vírus desconhecido na comunidade científica.
Coronavírus e o Furo no Grande Outro
por Thomas Svolos
Essa pandemia nos atingiu e, ao contrário de epidemias e pandemias anteriores, nós – cientistas, médicos, público em geral – não sabemos muito sobre ela. O agente infeccioso é novo, novo para a ciência, além de ser uma nova infecção em humanos.
Obviamente, os cientistas estão agindo rápido para aprender sobre o organismo, e os especialistas em doenças infecciosas estão agindo rápido para aprender como tratá-lo, e autoridades em saúde pública estão tentando desenvolver meios de prevenir ou minimizar a propagação do organismo, mas dito tudo isso – no momento, simplesmente não sabemos muita coisa.