Cláudio Ivan Bezerra
Como pensar a publicidade pelo viés da psicanálise hoje? Embora muito já se tenha escrito e dito no decorrer das décadas, é importante estarmos atentos a que o discurso publicitário sempre muda, se arroja e traduz os anseios de uma época, a fim de entregar nas mãos de sujeitos-consumidores o tão ilustrado objeto de desejo.
Os publicitários, marqueteiros e produtores audiovisuais estão à frente! Grandes aliados do capitalismo seguem responsáveis por criar cenários estimulantes, prover demandas, sugestões e necessidades e empurrar mercadorias que conectam com as demandas de uma época.
Por um lado, a Geração dos babies boomers [1940-1960], os filhos do pós-guerra que sonhavam com a paz e o amor, foi um passo para a materialização do chamado American Way of Life, que serviu não só como meio de consumo, mas como posicionamento de bem-estar e estilo do que deveria ser a vida após a 2a Guerra Mundial.
A Geração X [1960-1980], imersa na publicidade, traz consigo o mais alto grau de contato com a televisão. Suas reivindicações demonstram grande interesse no ganho financeiro, independência profissional e realização de desejos materiais, cenário propício para a evolução do cartão de crédito e acúmulo de gadgets.
Já a Geração Y ou Millennials [1990-2000], traz maior interesse por autonomia de trabalho e realidade virtual. Esta geração chegou com grandes avanços tecnológicos e econômicos, foi testemunha da maior revolução da história da humanidade: a Internet.
Por fim, chegamos à geração mais enigmática de todos os tempos, a Geração Z, que embora esteja hiperconectada, tem como sua maior reivindicação o ato de TRANSformar tudo. Ignoram estereótipos, valorizam muito mais o acesso do que a posse, e são conhecidos como mestres do eu, comprometidos que estão com a experiência. Daí toda a virada de jogo nas estratégias publicitárias, que antes privilegiavam layouts em revistas, outdoors, comerciais e merchandising com o mais alto grau de sedução – por cores, vitrines, textos ou modelos fotográficos. Atualmente, para se entender o que essa geração deseja é preciso aprofundar nas experiências de gozo, a fim de imprimir no discurso a ambivalência ter/ser.
Eis que surge com toda a força o Marketing de Conteúdo, as Personas e o Storytelling, ferramentas potentes emprestadas do cinema e que possuem amplo poder persuasão e engajamento pelos influenciadores de desejos, que postam suas produções em plataformas customizadas: YouTube, Tik Tok, Instagram, etc. Serviços oferecem em seu pacote standard, soluções avançadas de editoração de imagem e voz, capazes de transformar o usuário naquilo que ele desejar ser.
Como pensar a teoria psicanalítica em relação ao discurso publicitário e o Marketing e os efeitos de época para cada sujeito? Embora a clínica só se dê pela singularidade, sabemos estar diante de novos sintomas que surgem do princípio do prazer ao sofrimento, através da frustração. A busca incessante pela felicidade é descrita por Freud como uma tragédia do impossível em o Mal-Estar da Civilização e se cada sujeito nasce faltante, o que fazer com isso é a sua resposta mais íntima para a própria construção subjetiva.
Lacan lembra que, para o sujeito se defender do desamparo, é preciso elaborar um recurso imaginário, onde o desejo irá se situar. Aqui se destaca que este recurso não pode estar combinado ou fixado a um objeto, mas sim a uma fantasia, suporte que permita a circulação do desejo, servindo como metonímia do ser no sujeito. Aliado ao significante, o falo, a metonímia do sujeito no ser.
Ainda que o discurso publicitário tenha inspiração perversa, daquilo que exige uma condição para gozar e promete plena imersão à experiência de gozo, e a coleção dos objetos-fetiches, cabe a cada sujeito, haver-se com a própria falta, defender-se da própria angústia sob a égide do desejo. E quem sabe, refutar quaisquer soluções rápidas quem venham prometer o estancamento da falta com o empobrecimento da experiência.