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feito por nós #03

DAS SUPLÊNCIAS: DO SINTOMA AO SINTHOME¹

Marizilda Paulino – Membro da EBP/AMP
Photo by Conscious Design on Unsplash

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O tema que apresento nesta Jornada da EBP-SP diz respeito à clínica, à prática clínica, à formalização dos achados clínicos. Neurose, perversão e psicose foram os verbetes propostos.

Os textos básicos[2] estão em Scilicet dos Nomes do Pai, compilação de textos preparatórios para o Congresso de Roma, em julho de 2006.

Nomes-do-pai, seminário de uma aula só, em 20 de novembro de 1963,  anuncia a grande virada na formalização de Lacan em relação ao Nome-do-pai, considerando-se os anos 50 e 70 de seu ensino.

Nos anos 50, anos da clínica edipiana e do retorno a Freud, temos a prevalência do Nome-do-pai, da metáfora paterna e, dependendo de sua operação, estaríamos diante da neurose ou da psicose. Se o significante Nome-do-pai fosse instaurado teríamos a neurose e, na foraclusão do Nome-do-pai, a psicose.

Nos anos 70, com a introdução da clínica do nó borromeano, do enlaçamento peculiar dos três registros definidos por Lacan – Real, Simbólico e Imaginário -, o objeto a, a noção de gozo, temos à disposição um modo diferente de entender a clínica e de pensar a direção do tratamento. Não mais estamos diante de estruturas clínicas distintas e, sim, de diversas manifestações sintomáticas, inclusive algumas inclassificáveis. Não é mais a metáfora paterna que marca as distinções e, sim, a particularidade da amarração do nó.

Passamos da época do sintoma freudiano, que seria a representação da verdade do sujeito, para o sinthoma lacaniano, um misto de sintoma e gozo.

Do artigo de Luis Erneta destaco dois pontos:

1) A chave da metáfora paterna está na mãe – na simbolização da ausência da mãe –. A inscrição do Nome-do-pai fica subordinada a essa simbolização primordial que se opera na mãe. A criança pensa que é o falo da mãe, mas vê que é o pai que a mãe deseja – porque ele tem o que ela quer: o falo; esse movimento faz do desejo da mãe um significante e o falo será o significado desse significante. Daí o significante Nome-do-pai ser o significante-mestre cujo significado é o desejo da mãe. Quando há a inscrição da significação fálica teremos a neurose; na sua falta, a psicose.

2) Com a introdução do conceito de objeto a, fazendo parte da estrutura e tomando o lugar de resto pulsional impossível de simbolizar pela operação significante, Lacan demonstra que toda metáfora paterna fracassa e a neurose pode ser apenas um remédio para essa falha, pois essa falha não tem cura.

Podemos, então, pensar a neurose como uma suplência do Nome-do-pai.

Vale a pena lembrar que suprir quer dizer, segundo o dicionário de Houaiss, substituir (pessoas ou coisas); refere-se, portanto, a colocar algo no lugar de alguma falta, por exemplo. Suplência, por sua vez, é uma condição do que é suplente,  ou seja, daquele que supre uma falta ou que pode ser chamado a exercer as funções de outro, na falta deste, um substituto.

Alain Merlet lembra em seu texto que Perversão e Nome-do-pai não têm nada a ver com a religião e com a infâmia.

No seminário 23, O Sinthoma, Lacan inventa o termo pai-versão a partir do termo perversão. Merlet destaca três aspectos dessa questão levantada por Lacan:

1) “Perversão não quer dizer versão ao pai” – o pai é um sintoma ou sinthoma;

2) A “pai-versão” – refere-se a Freud e à função do pai: dirigir-se ao pai, que é o encarregado da castração”.

3) Freud sempre concebeu a sexualidade como sendo perversa (perversa polimorfa, como diz nos Três ensaios sobre a sexualidade, de 1905).

No seminário RSI, Lacan faz do nó borromeano a mostração da pluralidade dos Nomes-do-pai, que são o simbólico, o imaginário e o real, que servem para nomear qualquer coisa porque se trata do gozar.

Inventar com o sinthoma um tipo de sintoma que resista de tal forma que tanto do pai como da perversão se possa “prescindir à condição de se servir dele”.

Lacan para destacar a dimensão real do sinthoma – o real de seu gozo – fala do inominável (o real do gozo).

Recorre, então, ao Nome-do-pai nomeando-o como um furo e não uma falta. A invenção do sinthoma está em fornecer um ser ao pai – para não cair no culto do pai nem na idolatria da perversão.

O sinthoma, que é do falasser, propõe uma realidade psíquica diferente da religiosa ou perversa, uma realidade que não provém nem do ideal nem da obscenidade, mas permite um gozo compatível com o vivente.

A perversão estaria, então, mais ligada ao mal que a sustenta e a satisfaz.

Merlet termina seu artigo dizendo que se pode resumir a literatura psicanalítica em relação à perversão dessa forma: “se um perverso vem ver um analista, é porque se enganou de porta, se ele volta é porque ele não era perverso, se ele persiste a vir é para perverter o analista”.

Roger Wartel em seu artigo nos lembra que o “Nome-do-pai diz da filiação simbólica”, coloca-nos dentro do discurso, estabelece o laço social.

Nome-do-pai aparece em Freud nas funções, nas leis que ele promulga. Como o falo, o Nome-do-pai permite que se instaure a cadeia significante e seu serviço é o lugar de um Outro que dá acesso, autoriza e até mesmo impõe o jogo dos significantes.

A foraclusão do Nome-do-pai está no núcleo da psicose.  A marca do Outro da linguagem não está inscrita em nenhuma parte. Esta carência do significante do Nome-do-Pai não assegura a qualidade de discurso, de laço social e “coloca em questão os próprios fundamentos da linguagem humana, os enlaçamentos ou a disjunção da palavra à coisa”, como diz Wartel.

Nos anos 50, a foraclusão do Nome-do-pai marca que a estrutura neurótica  e a estrutura psicótica são completamente diferentes.

O próprio conceito de foraclusão – o “não existe” – permitiu apreender o que há de primordial sob o termo de Nome-do-pai, proporcionando efeitos na prática clínica.

De um lado, considerando-se o desencadeamento dos delírios, que eclodem na ocasião de um encontro, uma conjuntura, Lacan sustenta, em 1957, que o encontro será tanto mais perturbador, na medida em que “Um-pai vem a este lugar onde o sujeito não pôde chamá-lo antes.” Como consequência desse novo saber, aprendemos a ser mais prudentes, a não jogar com o significante com esse paciente atravessado por um gozo que ele experimenta como algo imposto ao seu corpo.

Wartel pergunta: Um Nome-do-Pai de suplência poderia focalizar e temperar, num feixe suportável, esse gozo arrebatador?

Por outro lado, Lacan em seu artigo “De uma questão preliminar a todo tratamento possível da psicose”, de 1957-58, elabora uma clínica nova, que não visa a extinguir o delírio, mas o respeita como criação de um mundo onde o sujeito possa viver, um Nome-do-pai de substituição, um significante que não obtura nem anula a foraclusão, mas que a tampona ou mascara até que uma evolução seja possível. Isso trouxe como efeito um olhar sobre a loucura por um outro ângulo, revolucionando os longos períodos de  hospitalização e a medicação usada nesses tratamentos.

Wartel propõe, como uma ousadia (sic), uma fórmula: enraizar em vez de erradicar, em nome do respeito que se deve ao sintoma, do trabalho do delirante em seu delírio, de uma restituição ao paciente de sua operação vital.

O sucesso da psicanálise trouxe para os consultórios dos psicanalistas um fluxo de psicóticos delirantes ou de psicóticos não-desencadeados, onde antes não eram atendidos por 10-20 anos.

Lacan, em seu segundo ensino, ao apoiar-se no nó borromeano do Real, do Simbólico e do Imaginário, torna as neuroses não tão separadas das psicoses. Passamos de uma clínica estruturalista, descontinuísta, para uma clínica continuísta, onde não trabalhamos com o conceito de estrutura clínica.

A psicose pode ser apreendida como a falha desse nó, a dispersão de seus anéis, seu relaxamento que deixa flutuante seu ponto virtual de imbricação, o pequeno a.

Nome-do-pai não iria desaparecer totalmente como foracluído, porque poderia haver uma suplência bem sucedida. Seria uma amarração diferente, a que seria possível para impedir a desordem e que serviria também para religar, reter os elementos em seu movimento de dispersão.

A suplência aqui seria o sinthoma, como Lacan tão bem descreveu no Seminário 23, O Sinthoma, de 1976, ao falar de Joyce.

Antonio Di Ciaccia, em seu artigo “Le Nom-du-Père: un trou”[3], diz que a expressão Nome-do-Pai é utilizada por Lacan sempre com a mesma significação: é a função-pivô para o ser falante.

No primeiro ensino, o Nome-do-pai é a função que assegura a ligação entre o significante e o significado. É a ancoragem simbólica que permite ao sujeito o acesso à normalidade. O pivô do humano é um pivô simbólico. O Lacan pré-lacaniano dos Complexos Familiares recorre à imago paterna para sustentar a função-pivô do humano. Em seguida, ele confere ao pai a função de ser significante e, logo, propõe uma precisão: o significante paterno não é significante porque é paterno, mas é paterno porque é significante. Como nem todo gozo é significantizado pelo significante paterno, há um resto de gozo na vertente do real e, no lugar do que garantia o sistema simbólico, um buraco. No último ensino de Lacan, a definição dada ao Nome-do-pai é a de ser um buraco. Mas ainda aqui, um pivô. O pivô é um buraco, um furo.

Para finalizar, e tomando como referência o texto de Carole Dewambrechies-La Sagna, Suplências e Nome-do-Pai, em Scilicet dos Nomes do Pai, p. 168, podemos pensar em Nomes-do-Pai e em diferentes suplências.

Lacan reinterpreta a questão freudiana do pai na psicanálise através dos registros Imaginário, Simbólico e Real e, a partir disso, podemos distinguir um pai imaginário, um pai simbólico e um pai real, extraindo dessa situação uma função, a função paterna.

Para todo sujeito falante, o Nome-do-pai é o significante que ordena o mundo e as questões da existência humana: as relações entre os sexos e as que dizem respeito à vida e à morte.

Para o sujeito psicótico, a metáfora paterna não pôde operar e ele não dispõe do Nome-do-pai para situar-se na existência, pois o Nome-do-pai está foracluído.

Lacan, ao estudar o caso Schreber, dá ênfase ao que Freud falava do delírio, como uma forma de reatar a relação com o mundo. Lacan fala do trabalho do delírio – o delírio como uma metáfora delirante -, que restabelece uma certa relação com o mundo e que representa, dessa forma, uma tentativa de cura. O delírio é pensado como uma metáfora que faz suplência àquela que não se instalou. A suplência é de significantização.

Mesmo na neurose, o Nome-do-pai não inclui totalmente o gozo e o sintoma neurótico desempenha também o papel de uma suplência.

Suplência e Nome-do-pai, ambos ocupam o lugar de alguma coisa que está vazia. Vão tentar preencher o buraco, como falou Antonio Di Ciaccia.

Se, no primeiro ensino de Lacan, o sintoma faz uma suplência ao Nome-do-pai e a metáfora delirante para o psicótico faz a suplência da significantização, no segundo ensino, na clínica borromeana, o quarto aro que faz o enlaçamento dos três aros (RSI) pode ser tomado como Nome-do-pai ou sintoma, na neurose, enquanto que – a partir do estudo de Joyce – temos um novo enlaçamento onde o Nome-do-pai é deficiente, não funcionou, fugiu da regra.

Joyce encontrou outra solução: a de “se fazer um nome” a partir de uma obra que, como ele mesmo disse, os universitários estudariam durante séculos. “É de se querer um nome que Joyce fez a compensação da carência paterna.”

Lacan interpretou a escrita de Joyce como “sinthomática”, um misto de sintoma e gozo, e propôs que o caso Joyce fosse considerado “como resposta a uma maneira de fazer suplência a um desenlaçamento do nó.”

O trabalho efetuado por Lacan, como salienta a autora, tem como efeito uma mudança nas formas da psicose: existem os “casos Schreber” e outros semelhantes a “Joyce”.

Tem-se uma clínica das suplências, sem o recurso no Nome-do-pai, onde se estuda como o sujeito pode manter juntos, Imaginário, Real e Simbólico. As suplências não são apenas reservadas ao simbólico e podem ser também da ordem do imaginário e do real.

A questão das suplências diz respeito a todo ser falante.

“O buraco do simbólico existe para todos: não existe no inconsciente o significante da mulher que permitiria que a relação sexual pudesse se escrever, o que Lacan resume em “não há relação sexual”. Este “não há” determina um lugar vazio que convoca sempre uma suplência.”

A autora termina seu artigo dizendo que “o pai freudiano não existe mais e a ciência do real aberta por Lacan faz suplência, por sua vez, a esta versão do pai. O dizer verdadeiro, necessário na experiência analítica, tem que fazer uma articulação com esta ciência do real.”

 

Texto publicado no site da CLIPP, em artigos, junho/2006
[1] Texto elaborado para ser apresentado na Jornada da EBP-SP: Os Nomes-do-Pai – religião, cultura, literatura, clínica – em 13 de maio de 2006.
[2] Erneta, L., Neurose e Nome-do-Pai, Scilicet dos Nomes do Pai, p. 102
Wartel, R., Psicose e Nome-do-Pai, Scilicet dos Nomes do Pai, p.145
Merlet, A., Perversão e Nome-do-Pai, Silicet dos Nomes do Pai, p.134.
[3] Di Ciaccia, A., Le Nom-du-Père: un trou”,  La Lettre Mensuelle, n. 247, abril de 2006.

feito por nós – Partindo de verbetes do Scilicet dos Nomes do Pai, Marizilda realiza uma curiosa explanação acerca da formalização dos achados clínicos psicanalíticos. Cita que “No Seminário 23, O Sinthoma, Lacan inventa o termo pai-versão a partir do termo perversão” sinalizando que, “‘perversão não quer dizer versão ao pai’, – o pai é um sintoma ou sinthoma”. Destaca que “Lacan interpretou a escrita de Joyce como ‘sinthomática’, misto de sintoma e gozo, e propôs que o caso Joyce fosse considerado como resposta a uma maneira de fazer suplência a um desenlaçamento do nó”. Sublinha que “O Nome-do-pai aparece em Freud nas funções, nas leis que ele promulga” e que, no primeiro ensino de Lacan, “o Nome-do-Pai é a função que assegura a ligação entre o significante e o significado. É a ancoragem simbólica que permite ao sujeito o acesso à normalidade”, salientando que, “Para todo sujeito falante, o Nome-do-Pai é o significante que ordena o mundo e as questões da existência humana: as relações entre os sexos e as que dizem respeito à vida e à morte”. No que se refere ao sujeito psicótico destaca que, ao estudar o caso Schreber, Lacan apresenta o delírio enquanto metáfora delirante. “O delírio é pensado como uma metáfora que faz suplência àquela que não se instalou”. De modo que, o que Lacan propõe é “(…) uma clínica das suplências, sem o recurso no Nome-do-pai, onde se estuda como o sujeito pode manter juntos, Imaginário, Real e Simbólico”.

Perpétua, tendo em conta que Lacan considerou a escrita de Joyce como uma maneira de fazer suplência a um desenlaçamento do nó e que, no caso Schreber é a metáfora delirante que é postulada por ele como a forma de fazer suplência à metáfora paterna que não se instalou, o que distingue a suplência estabelecida no caso Joyce da suplência estabelecida no caso Schreber? Em termos de função, o que você poderia nos dizer sobre essas suplências que não contam com o Nome-do-Pai?

pergunta elaborada por Vera Dias

Perpétua Medrado – Quero agradecer ao feito por nós poder voltar ao texto da Marizilda Paulino[1] e a esse tema das suplências. Em seu texto, Marizilda aponta a leitura feita por Lacan nos anos 50, onde ele estabelece uma leitura particular do complexo de Édipo e destaca a função do Nome-do-Pai como ordenador da significação fálica que promove a articulação simbólica.

Lembra que nos anos 70 com a introdução da clínica do nó borromeano, do enlaçamento peculiar dos três registros definidos por Lacan – Real, Simbólico e Imaginário -, o objeto a, a noção de gozo, temos à disposição um modo diferente de entender a clínica e de pensar a direção do tratamento.

O conceito do Nome-do-Pai, marca do primeiro ensino de Lacan, que tem como função manter junto um a um o Real, Simbólico e Imaginário para cada sujeito, e dessa forma fazer consistir o laço social.

Para tentar responder a pergunta da Vera Dias pensei em retomar a tese lacaniana no que diz respeito à invenção nas psicoses.

Miller se apoia na tese lacaniana em O Aturdito[2], “A função de cada um dos seus órgãos constitui um problema para o falasser. Isso especifica o esquizofrênico, ser capturado sem o socorro de nenhum discurso estabelecido”.  Essa é a tese lacaniana que justifica a pertinência do termo invenção nas psicoses. Nesse texto Lacan nos remete a fórmulas da sexuação em que o lugar do pai é aquele que não está sujeito à castração, abrindo dessa forma, uma exceção à regra da castração.

Penso que se tornou necessário enfatizar a revisão que o último ensino de Lacan impôs à sua primeira clínica, cujo eixo era organizar as estruturas em torno da presença ou ausência do Nome-do-pai. Um dos pontos paradigmáticos é a concepção das psicoses nas duas clínicas: na primeira clínica a psicose é vista sob a ótica do déficit simbólico, como ausência daquilo que opera na neurose, ou seja, a solução psicótica nesse período é apoiada no modelo neurótico, da metáfora delirante, o Nome-do-Pai é o operador principal. Já na segunda clínica, a ótica recai nas operações que um psicótico pode inventar. Estamos aqui nos Seminários 22 R.S.I e Seminário 23 o sinthoma, no chamado  último ensino de Lacan. É nesse momento de seu ensino que ele introduz a teoria dos nós e retoma a antiga grafia da palavra symptôme. As soluções psicóticas nesse momento do seu ensino ganham novo estatuto com a formulação topológica do nó borromeu a três, e mesmo com a proposição do nó borromeu a quatro.

É nesse momento também que sinaliza que o pai é um sinthoma, que amarra os três aros, criando o laço enigmático do imaginário, do simbólico e do real.

Como vimos o conceito do Nome-do-Pai permite resignificar toda série de versões do pai que Lacan desenvolveu ao longo do seu ensino e permite localizar nesses dez anos de seu ensino uma mudança na clínica, vinculando à suplência ao Nome do Pai, o sinthoma como o que enlaça, como o que vem reparar o furo do nó de três aros: “O que proponho é que se considere o  caso de Joyce como respondendo a uma maneira de suprir um desenlace do nó”.( Lacan Seminário 18[3] ). O sinthoma Joyce vem suprir o fracasso do nó reforçando o aro do simbólico e reparando a cadeia borromeana[4].

O Lacan dos anos 70, no seminário RSI, liga a função do pai à função do sintoma, sendo o sintoma um significante que carrega gozo, uma marca de gozo destinada a se repetir. O sintoma como modo de gozo e como instrumento de localização do gozo.

Jean-Pierre Deffieux, em seu texto Nome-do-Pai e suplência, retoma a questão de Lacan no Seminário R.S.I[5], é possível dissociar suplência de Nome-do-Pai? “Para que se enlacem estes três, é necessariamente preciso um a mais – a consistência deste deveríamos  referi-la à função do pai? O nó borromeano demonstra o contrário[…]. Esta função suplementar do pai, seria indispensável? Estou lhes mostrando que isso poderia ser artificioso (contruvé). – Deffieux citando Lacan Seminário R.S.I.

Nesse Seminário R.S.I., Lacan aproxima suplência e nomeação, lembra que “o sintoma tem a função de “nomeado para” Joyce, convocado ao trabalho de escrita para escapar do rumor incessante de lalíngua, se encontra nomeado para uma função à qual ele dedicará sua vida. E por isso mesmo ele ali encontra seu nome próprio”. – Deffieux citando Lacan Seminário R.S.I.

Lacan vai nos dizer que o ego de Joyce está apoiado sobre a escrita, uma escrita sinthomática. Lembremos que o termo sinthome para Lacan designa a função especíica que teve a escrita para Joyce. Lacan generaliza o uso desse termo para dizer que a suplência reestabelece o nó borromeano dos três registros – Real, Simbólico e Imaginário. Propõe considerar o caso de Joyce como uma resposta a uma maneira de fazer suplência à um desenlaçamento do nó.

Para concluir, é importante lembrar que Lacan da segunda clínica é essencial para a clínica das psicoses, e se existem psicóticos schrebianos, também existem joyceanos. “Uma clínica das suplências conheceu o tempo em que se estuda como, sem o recurso do Nome-do-Pai, um sujeito pode manter juntos, imaginário, real e simbólico, mas também podem perfeitamente ser da ordem do imaginário e, mesmo, do real, o que a transferência como real demonstra com frequência.”

Podemos chamar as invenções de soluções sinthomáticas a partir da ideia de que é possível aproximar a invenção do que Lacan destacou em Joyce.

 


[1]Paulino, Marizilda. Das suplências do sintoma ao sinthome. In Artigos CLIPP
[2]Lacan, J. O aturdito. In Outros Escritos. Rio de Janeiro,: Jorge Zahar Ed., 2003.
[3]Lacan, J. Seminário XVIII De um discurso que não fosse semblante. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed., 2009.
[4] Deffieux, Jean-Pierre. Nome do Pai e suplência. In Opção Lacaniana Edição especial, nº50, Dezembro 2007.
[5] Lacan, J.Seminário R.S.I. Inédito