Kátia Ribeiro Nadeau (CLIPP)

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A Revista Hades traz como tema desta edição As Psicoses que vários autores desenvolvem, articulando de maneira muito interessante, sob os traços e letras singulares, aquilo que cada UM colocou de si nestes escritos. Trata-se de uma edição que privilegia as psicoses em suas ressonâncias com o ensino da Clipp, a partir do curso de formação e seus efeitos de escrita na formação do analista.

Veremos como os casos Schreber e Aimée ensinam até hoje, à nós psicanalistas de orientação Lacaniana, que se deixam ensinar assim como Freud e Lacan em suas relações com a causa analítica.

Escrever, ler, transmitir são coisas do Real; afinal, tomar a palavra neste sentido é ir além do simbólico, como terão oportunidade de ler nos textos aqui publicados.

Maria Bernadette Soares de Sant´Ana Pitteri nos convida a percorrer entre dúvidas e certezas os caminhos de  Descartes e Schreber; enquanto Descartes se vale da dúvida como método para validar ou rejeitar as certezas, Schreber coloca a dúvida como o que ultrapassa a capacidade de entendimento humano, sem com isso abalar sua certeza nas articulações com a inexistência da relação sexual. A partir desta questão, seguem elaborações sobre as soluções borromeanas em ambos.

Marizilda Paulino nos apresenta suas considerações sobre o que e como nos ensina a clínica das psicoses fazendo um percurso da impossibilidade que Freud trabalhou, até Lacan que, ao subverter as certezas, subverte também sobre o que o psicótico nos ensina, colocando o saber do lado do psicótico.

Maria Helena Barbosa escreve como Lacan desenvolve a apreensão do Real por Marguerite Duras, que funciona como uma interlocução com o saber psicanalítico. Como uma preciosa demonstração, aquilo que Lacan ENSINA, Marguerite Duras SABE, articulando letra e inconsciente ao permitir situar as relações do sujeito com o corpo. Dos três tempos escandidos pelo fantasma ao objeto olhar, o arrebatamento se destaca tanto em Marguerite Duras quanto nos psicanalistas arrebatados pelo estilo de transmissão de Lacan.

João Paulo Desconci toma os desenvolvimentos do último ensino de Lacan como método de estudo para pesquisar de que modo o trauma da linguagem afeta a criança autista. O texto traz muitas referências tanto de psiquiatras quanto de psicanalistas, que de alguma maneira contribuem para precisar o particular funcionamento do autismo em suas relações com a estrutura, com a clínica, com a linguagem e com o corpo.

Carlos Ferraz em seu texto sobre as irmãs Papin, destaca algumas reflexões de Lacan até a contemporaneidade, sobre a lógica da passagem ao ato que desnuda a violência da angústia, de um gozo sem a mediação do registro simbólico.

Rodrigo Camargo desenvolve, sob a rubrica Territórios Millerianos, a invenção do parceiro sintoma e coloca o gozo em questão, como a chave que irá definir a maneira  de situar o parceiro, na transferência analítica ou  na vida.

Célia Siqueira articula a questão da criança como um sujeito de pleno direito, descrita por Lacan ao interrogar o modo de interpretar a questão do gozo na psicose infantil.  Freud situa a criança como “ideal do Eu”, enquanto Lacan vai seguir na direção do sintoma infantil que ocupa a posição sobre “a verdade do casal parental”.

Marcelo Rocha privilegia a discussão de um caso clínico apresentado por Esthela Solano-Suárez, no qual a criança dá conta do deciframento produzido pelo casal parental, na tentativa de fazer a relação sexual existir. Com articulações entre castração, fobia e angústia podemos acompanhar a interessante posição na qual é a mãe quem irá operar simbolicamente a castração. No que tange à dimensão do significante, há uma desmontagem feita pela criança que lhe permite a localização do gozo.

Mariana Almeida aponta para as questões e referências da psicanálise de orientação lacaniana no tratamento das psicoses. Temos um interessante percurso entre aproximações e distinções entre a psiquiatria e a psicanálise lacaniana, que aborda a leitura freudiana do delírio de Schreber como linguagem do inconsciente em suas relações com as psicopatologias de sua época.

Não percam o Podcast desta edição: Cláudio Ivan Bezerra entrevista a atual Diretora da Clipp, Daniela de Camargo Barros Affonso, numa conversa esclarecedora sobre a passagem do patológico à “loucura”, tal como tratado pela Psicanálise Lacaniana. Em uma linguagem clara e acessível, temas preciosos como a transferência e a posição do analista no tratamento das psicoses, são contemplados no que estas nos ensinam hoje.

 

Boa leitura a todos!