Débora Garcia (CLIPP)
A série turca “8 em Istambul”(*) nos leva com sensibilidade e dureza às trilhas inventadas por cada sujeito para lidar com uma sociedade marcada e dividida pelo extremismo em relação à mulher, ao feminino, ao amor, ao desejo, ao sexual e às diferenças. É também um belo retrato sobre como o inconsciente encontra formas de se manifestar.
Trata-se de uma trama que envolve 8 pessoas com vidas diferentes que se encontram e têm seus caminhos afetados por esses encontros.
Duas personagens em especial ressoaram em mim algo do que aprendemos em Freud sobre a histeria. A personagem que é o ponto de partida da série: uma jovem que busca uma psicanalista por causa de seus desmaios e sua cunhada que apresenta uma profunda depressão. Ambas apresentam, cada uma ao seu modo, ou melhor, cada uma com seu sintoma, algo que não pode ser dito.
O caso Dora, publicado em 1905, apresenta a análise de um caso de histeria. Trata-se de uma jovem de dezoito anos que apresentava sintomas de tosse nervosa e afonia, sendo seu quadro definido como uma “petite hystérie”. Freud adverte que desde que lançara “Estudos sobre a histeria” em 1895, seus métodos já haviam se modificado e, nesse sentido, Dora pode dizer, pelas palavras que lhe faltam, aquilo que não sabe sobre si. Desde Freud, o sintoma histérico é um sintoma que fala, sendo portador de um sentido que se fundamenta no amor ao pai.
E com Lacan aprendemos também que a histeria é marcada pela pergunta “o que é ser uma mulher?”.
Mas com o declínio do Nome do Pai e a orientação pelo real, se o sintoma histérico já não tem seu eixo no amor ao pai, como então repensar e atualizar a histeria hoje?
(*) 8 em Istambul (Bir Baskadir. Direção e roteiro: Berkun Oya. Turquia. Netflix, 2020.