Em Louis Althusser: identificação patronímica ao gozo Um, Carlos Ferraz fala da responsabilidade daquele que comete o ato de esganar ou apertar o gatilho contra alguém, caracteriza o crime como algo que não se restringe ao momento em que o caso chega à Justiça. Há um “antes, um durante e um depois”. A discussão produzida na mesa simultânea, em que esse trabalho foi apresentado, me fez pensar nos tempos e na responsabilidade individual e coletiva das VII Jornadas (EBP-SP), como uma experiência digna de seu título Pai-versões. Com várias versões do programa, esta foi reinventada em tempo real. Seus organizadores se responsabilizaram por seus atos e colocaram o manejo no lugar do “esganar”, um processo no lugar do produto. Isso teve consequências.
Protocolarmente as Jornadas acontecem em três tempos: concepção, preparação e organização, e encontro entre convidados, organizadores e público. E agora José?“O convidado cancelou sua participação às vésperas…”. A contingência permitiu ao convidado, sem querer, cometer um tipo de ato analítico colocando uma pedra no caminho dessas Jornadas. Com tudo engatilhado, isso produziu incômodo, retirou seus organizadores da zona de conforto. O que se perde e o que se ganha com esse acontecimento? Não importa o que fazem comigo, mas o que faço com o que fazem comigo... Isso é psicanálise também! Sem vitimização, ou tratar isso como trauma, reorganizou-se um programa, sustentou-se o desejo de uma transmissão implicada num evento dessa natureza.
Atravessou-se o litoral do − tempo de organização − para dar lugar a uma Jornada construída ao longo da sua realização. Não cancelou-se o evento, nem evitou-se atalhos para facilitar, pisou-se na pedra que deixou marcas no Real dessa Jornada. No lugar de substituir o convidado por outro, apenas para garantir uma satisfação dos inscritos e uma jornada com um produto pronto e acabado, manejou-se. Tal manejo teve consequências em uma transmissão da psicanálise lacaniana que prima pelas ideias: “a relação sexual não existe…”, “A mulher não existe”. O convidado não existe. Existiu um convidado singular presente através de uma escrita, um texto, um saber transmitido muito bem articulado com a transmissão da M.-H. Brousse em uma atividade preparatória.
Um dos participantes das mesas de encerramento aceitou o convite de última hora para sustentar aquela que seria a última versão do programa − “ainda não chegou”. Burburinhos… “ele está voando”, “está no taxi”, “chegando…” Não distante da experiência de Lacan que ao abrir a porta do seu consultório se deparava com uma sala de espera lotada, os organizadores manejaram e surpreenderam um auditório com aproximadamente 200 participantes que esperavam… “vamos ter que fazer uma pequena alteração” e anunciou nova ordem de comentários dos passes. Ao final, cumprindo o compromisso contratual da sala, coube à Coordenadora Geral se responsabilizar pelo corte − “ao contrário do que foi programado, vamos encerrar essa mesa sem perguntas do público…”.
Nessa contingência, Sérgio Laia iniciou sua peregrinação de A.E., Luiz Fernando Carrijo encerrou seu ciclo de escrever sobre seu passe e apresentou sua 28a versão, sem perguntas do público. Ainda com o texto do Carlos Ferraz, penso nesse corte como algo que permitirá a cada um dos presentes dar outro destino para suas questões. Depois cada um usará o saber construído coletivamente nessas Jornadas para produzir seu quarto tempo…
Essas Jornadas ficam na histórias como um processo criativo, reinventada e manejada até o encerramento. Nada de apresentação de um produto pronto e acabado, nada de público passivo. Cada um, do seu lugar, contribuiu para essa construção. Como contraponto dessa experiência, tivemos a livraria com “produtos” ordenados e êxito nas vendas, apesar de imprevistos, a impecável recepção que entregou uma pasta contendo uma programação que não existiu!
Palavras chave: Fazer – de – um – fracasso – um – sucesso – não – é – para – principiante.
Maria Noemi de Araujo (SP: 22/10/2017)