O Real da Abstinência Analítica
Por Geert Hoornaert
Depois de Freud apontar que nada pode ser morto in absentia ou in effigy, Lacan insistiu em todo o seu ensino que o tratamento requer uma presença real, para além dos corpos imaginário e simbólico do analista. Essas duas indicações essenciais são de especial relevância atualmente.
Elas situam o analista em um lugar onde, para encarnar a Coisa, ele se afasta da comunicação simbólica. Assim, depois de ter sido o espantalho do inconsciente, ele estabelece um limite para isso. Seja na forma da análise borromeana, onde cada registro limita os outros dois registros em sua expansão sempre possível, seja através de sua insistência na inexistência da relação sexual, Lacan sempre orientou a análise para uma impossibilidade radical, uma objeção fundamental ao que pode ser dito e ao que pode ser imaginado . O instrumento dessa operação é o analista que, quando ele é real, não está conectado a nada.[1] Ser fiel a esta orientação não implica necessariamente que o analista deva renunciar a qualquer uso dos meios de comunicação atuais. Significa apenas que, quando ele usa essas ferramentas, ele deve saber o que está fazendo. Pois um bate-papo não é uma sessão.[2]
Poderíamos dizer que uma sessão requer presença como tal, enquanto um bate-papo requer conexão. Como pode o analista lidar com essa dimensão da conexão se, para encarnar uma dimensão do real para seu analisando, ele deve incorporar uma negatividade absoluta na interlocução?[3] Os meios de telecomunicação, que a necessidade pode nos impor atualmente, prestam-se espontaneamente a essa encarnação da não relação, a esse real da abstinência analítica? O que vemos é, antes, que eles não reservam lugar ao “silêncio das pulsões” e que apoiam a ilusão do Todo-simbólico, a lógica da tela e a psicologia do “contato”.
O uso temporário desses instrumentos pode ser necessário em algumas situações, mas uma conversa por esses meios não pode de forma alguma substituir a sessão baseada no discurso analítico. É numa entrevista que Jacques-Alain Miller concedeu ao Libération em 1999 que vemos o porquê disto formulado da forma mais clara. “Ver um ao outro e conversar não é uma sessão analítica. Na sessão, dois estão ali juntos, sincronizados, mas não estão ali para se ver, como mostra o uso do divã. A co-presença em carne e osso é necessária, nem que seja apenas para provocar a não relação sexual. Se sabotamos o real, o paradoxo desaparece. Todos os modos de presença virtual, por mais sofisticados que sejam, tropeçarão nisso.” [4]