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CARTEL: UM DESTINO DA TRANSFERENCIA?

 

 

Huguette Caland

 

Débora Garcia (CLIPP)

O laço entre amor, transferência e inconsciente em uma experiência analítica foi o tema de minha pesquisa quando iniciei o Cartel há quase dois anos, o qual recentemente foi concluído. As questões em torno do amor, da transferência e do inconsciente nascem da minha posição de analisante e marcam o desejo de saber que endereço ao Cartel. O consentimento com menos inibições em ocupar um lugar transferencial para aqueles que buscam uma análise, possibilitando a entrada em análise, também advém de um efeito de análise que atravessa a minha posição de analista praticante. O laço entre amor, transferência e inconsciente desenvolvido na análise pessoal de um sujeito pode ou não levar o analisante a tornar-se analista e, neste caso, qual o destino da transferência advinda da análise pessoal? A questão que se abre é a formação do analista: em uma análise que dura, o cartel, enquanto um dispositivo da Escola que recebe as questões e elaborações, seria um destino da transferência?

Miller em uma entrevista concedida à Hanna Waar, do Psychologies Magazine, discorre sobre a nascente de uma análise.

“A psicanálise ensina alguma coisa sobre o amor?”, pergunta Hanna Waar e Miller responde: “Muito, pois é uma experiência cuja fonte é o amor. Trata-se desse amor automático, e frequentemente inconsciente, que o analisando dirige ao analista e que se chama transferência. É um amor fictício, mas é do mesmo estofo que o amor verdadeiro. Ele atualiza sua mecânica: o amor se dirige àquele que a senhora pensa que conhece sua verdade verdadeira. Porém, o amor permite imaginar que essa verdade será amável, agradável, enquanto ela é, de fato, difícil de suportar”.

A entrevistadora, então, indaga: “Então, o que é amar verdadeiramente?”

“Amar verdadeiramente alguém é acreditar que, ao amá-lo, se alcançará uma verdade sobre si. Ama-se aquele ou aquela que conserva a resposta, ou uma resposta, à nossa questão ‘Quem sou eu?’”, responde Miller. 1

Desta forma, o laço feito entre amor, transferência e inconsciente se dá na suposição de saber depositada no analista, instaurando, assim, a transferência. O saber suposto ao analista é o saber no inconsciente do sujeito.

A diminuição das inibições da análise pessoal da analista, permitiu por exemplo, uma interpretação menos usual na condução de determinado caso, possibilitando a paciente ao consentimento do inconsciente e a consequente entrada em análise. A intervenção neste caso teve como efeito na paciente a recordação de abusos sofridos na infância e a coragem de falar destes. Nas sessões que transcorrem seu gosto pelas artes e poemas seguem emergindo.

O destino transferencial de uma análise pessoal, portanto, além de possibilitar ocupar um lugar transferencial para um outro, tem permitido o endereçamento dos efeitos disso a um Cartel, o que demonstra a passagem para uma transferência de trabalho.

*Cartel: Transferência

1 http://www.lacan21.com/sitio/2021/05/30/entrevista-a-jacques-alain-miller/?lang=pt-br