Scroll to top
  • Tel.: (11) 3864.7023

Ri3: Folhetim preparatório das Jornadas de 23-24 de janeiro de 2010

Michel Neycensas – ITEP Bellefonds

Max tinha sete anos quando pulou da janela do seu quarto.  Assim Mary Carmichaël abre seu artigo  “Bem vindo ao mundo de Max” publicado em Newsweek, (05/008). Uma passagem ao ato desdobrada naquilo que, nos Estados Unidos, tornou-se conveniente chamar de distúrbio bipolar.

História clínica:

Marx veio ao mundo com uma deformação cardíaca impondo-lhe intervenções cirúrgicas e hospitalizações. Desde seus primeiros meses de vida gritava, urrava, batia a cabeça contra as paredes sem cessar. Por volta de um ano, tapou os ouvidos, mas andava e fazia frases. O estado  de Marx deixava os médicos perplexos até o resultado do diagnóstico psiquiátrico que o incluiu entre as 800.000 crianças portadoras de distúrbio bipolar, por apresentar  um quadro associando excitação, depressão e escorregões emocionais.  Mas, tal diagnóstico é raramente concluído. Os tratamentos médicos existentes ignoram os mecanismos de ação e seus efeitos sobre a evolução do cérebro. Embora, não existam estudos aprofundados, consta que quando esta doença não é tratada seus efeitos são desastrosos, cada vez mais a saída recorrente tem sido o suicídio.

Prescrição:

Prescreveu-se para Max um primeiro regulador de humor desde a idade de dois anos que não fez efeito. Um antipsicótico deu um descanso.  Alguns meses mais tarde o mesmo especialista “enriquece” o diagnóstico: Max sofre de uma síndrome de TDHA, “é grave e incurável”. Segundo o artigo, os cientistas situam as causas dos distúrbios bipolares numa amídala, foco das emoções. Esta que apresenta uma grande atividade contrária à do córtex prefontral,  a sede do pensamento racional (o de Marx) apresenta um defeito de atividade. Conclusão lógica: “As crianças bipolares são tão influenciadas pelas suas emoções que nem podem pensar”.  A causa dos distúrbios bipolares não pode “ainda” ser identificada pelo IRM e “o diagnóstico ressalta mais de arte que de ciência”.No entanto, sabe-se que os bipolares percebem o mundo  de um modo dramático e perigoso.

Terapia:

Diante do fracasso dos medicamentos, Max encontra então um especialista das terapias comportamentais e cognitivas. Uma nova bateria de exames é efetuada, o garoto passa um IRN e novas prescrições lhes são administradas. Diríamos que este especialista ofereceu  novas esperanças à família. Pouco a pouco, o estado de Marx se agrava: dá uma escapadinha, ouve vozes, pensa que sua mãe vai lhe prender.

Passagem ao Ato:

Aos sete anos e meio, ele tomou tanto medicamento que “não se sabia mais se eles o ajudavam ou se eram nefastos”. Interromperam-se os medicamentos. Isto piorou o estado da criança porque “nus os receptores dopaminergiques  ficaram muito mais sensíveis”!  Max fala de morte sem parar. Dois meses mais tarde, pula da janela do seu quarto. Tal passagem ao ato  abre o artigo da revista americana!  Max escreveu uma carta para dizer a quem ele confiaria seus brinquedos e também de todo seu sofrimento:

“ Todos os dias tenho vontade de me matar, não posso dormir a noite, papai me aborrece para que eu durma, mas não posso fazer nada, é mais forte que eu. Não sei o que me controla, mas sei que não sou eu. Preciso verdadeiramente,  de ajuda ”(…)

            Urgência então. Max escapa…

Como sua mãe anotou cuidadosamente, aos dez anos o menino tomou 38 medicamentos diferentes e ganhou muito peso. Max é um resto (destroço), uma « ruína emocional ». Entretanto, o autor acrescenta que enfim a família fez as pazes com os medicamentos. Durante estes anos, Max freqüentou escolas em que, a cada vez mais, era excluído por conta de suas crises e passagens ao ato sobre os seus camaradas. Enfim, sua família encontrou um modo de incluí-lo numa escola especializada, privada e, portanto, paga. O garoto disse que as práticas esportivas (equitação, karatê) lhes davam algum apaziguamento. Mas um detalhe precioso se deslizou na reportagem: Marx encontrou um menino muito doce e calmo que se tornou seu melhor amigo.

Este artigo, de grande alcance público, mostra um exemplo da prise en charge das crianças psicóticas dos Estados Unidos. A parte reservada à psicoterapia é bem modesta: uma proposta terapêutica pelo jogo e, ao que tudo indica, de inspiração kleiniana foi interrompida após uma passagem ao ato de Marx  sobre seu terapeuta.  A psiquiatra medical e científica domina as ofertas de cuidados (tratamentos).  Os diagnósticos, ajustados às sentenças aplicáveis, se desmultiplicam em uma arborescência cuja base é ocupada pelo distúrbio bipolar.   Nessa massa diagnóstica, respostas terapêuticas se juntam umas às outras. A estas errâncias, aquelas respostas de familiares endereçadas a um percurso semeado de  emboscadas e aos seus próprios sofrimentos subjetivos. (Folhetim  preparatório das Jornadasdanielroy@wanadoo.frherve.damase@orange.fr.; Informações: www.ri3.be).

Tradução: Maria Noemi de Araujo (para uso do Laboratório, e.f., Infância. CIEN-SP).